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Relatório de Mercado da Pecuária – Entressafra

O atraso no início da entressafra postergou os seus efeitos, mas, agora que as chuvas diminuíram e a temperatura subiu, a pecuária deve vivenciar um segundo semestre típico com a oferta restrita, exportações mais fortes, consumo sazonalmente maior e preços em alta.
A evolução do ano foi muito atípica, pois as exportações sofreram fortes oscilações nos primeiros meses do ano, os abates registraram queda até abril e chuvas excessivas em junho alongaram a safra, uma combinação que deprimiu o preço da arroba por mais tempo que o normal.
A informação que a proporção de fêmeas no abate voltou a crescer em 2011 criou a impressão de mais um ciclo pecuário, capaz de deprimir o preço da arroba por um longo período, mas os abates menores que no ano passado e a safra alongada foram preponderantes na criação de um excesso de animais terminados que explica a extensão da queda do preço até agosto.
Uma vez que os abates voltem a crescer até se aproximarem do acumulado em 2011 – crescimento necessário, visto que as exportações este ano estão 8% maiores – a demanda por animais no segundo semestre vai crescer e encontrar a oferta naturalmente restrita pela entressafra.
O choque agrícola nos Estados Unidos elevou os custos da atividade de confinamento a partir de julho, o que coincidiu com recuo atípico do preço a vista ao longo de julho e provocou a queda temporária da cotação do contrato futuro referência para a entressafra.
Este duplo choque na margem da atividade de confinamento alterou a intenção de confinar animais com entrega a partir de outubro. A reversão de parte das decisões de confinamento vai comprometer a oferta dos meses finais do ano, o que deve restabelecer uma parte da normalidade na trajetória do preço durante a entressafra, após um ano cheio de comportamentos fora do normal.
O desafio final para o restabelecimento da normalidade será o regime de chuvas a partir de outubro, este ano influenciada pelo El Nino.
Custos – milho abaixo do preço internacional
O preço do milho no Brasil se estabilizou no mês de agosto após forte alta ao longo do mês de julho. A estabilização refletiu a própria maior estabilidade do preço internacional, o qual parece ter incorporado a alta necessária para regular a demanda americana (e global) diante da escassez surgida com a quebra da safra.
O preço brasileiro subiu menos que o internacional, pois a coincidência do choque climático nos Estados Unidos com a colheita de uma excelente segunda safra de milho evitou uma alta muito forte. A cotação com referência em Sorriso encontra-se abaixo de 60% do preço a vista americano, quando normalmente oscila entre 65% e 85%. A cotação com referência em Campinas está ainda mais abaixo de sua relação histórica com o preço nos Estados Unidos.
A exportação de milho foi recorde em julho e agosto (1,7 e 2,8 milhões de toneladas contra 0,3 e 1,5
no ano passado), o que é um começo expressivo para uma temporada que geralmente é forte entre
agosto e o final do ano. O desconto em relação ao exterior na cotação do milho brasileiro pode
diminuir na medida em que os embarques elevados aproximem o preço do milho no Brasil da
cotação internacional.
Oferta e Demanda
As exportações de carne bovina sustentaram o segundo mês consecutivo com crescimento de 27%
sobre o ano anterior. O acumulado nos primeiros 8 meses ano já registra aumento de 8% no volume,
o melhor desempenho desde 2007 ou 2005, quando as exportações cresciam a taxas anuais elevadas,
até enfrentarem quatro anos de quedas consecutivas após 2008.
Os abates também passaram a mostrar clara recuperação. O detalhe da produção industrial referente
à produção de carnes mostrou nova alta em julho, embora ainda não tenha retornado para o patamar
vigente no primeiro trimestre de 2011, pouco antes das exportações caírem por conta da menor
demanda no Norte da África e no Oriente Médio, na esteira da Primavera Árabe e suas mudanças
políticas.
O consumo doméstico de carne bovina foi prejudicado no primeiro semestre, mas possui elementos para reverter a situação. Os detalhes do IPCA-IBGE e do IPC-S – FGV mostraram que o preço da carne bovina subiu 12% entre junho e dezembro de 2011, enquanto o frango e o suíno subiram entre 7% e 8%. Esta alta no varejo superou em muito a elevação da arroba do boi e mesmo a variação do boi casado, o que resultou no surgimento de elevada margem no varejo desde o final do ano passado.
Esta discrepância levou a razão entre o preço da carne bovina e as de frango e suína para próximo de seu nível máximo, o que deve ter prejudicado o consumo de carne bovina numa situação em que as vendas nos supermercados cresceram entre 7% e 9% no primeiro semestre, a depender da fonte da informação.
Um consumo doméstico fraco é o elo final para a explicação da expansão dos abates abaixo do crescimento das exportações. O crescimento modesto dos abates diante de uma oferta adequada e, ainda por cima, aumentada pelo maior abate de fêmeas nos primeiros meses do ano, deixou o mercado de boi gordo desequilibrado e com excesso de oferta durante todo o ano.
O auge deste processo se deu ao final da safra, quando fortes chuvas em junho (totalmente fora do padrão) garantiram pastagens para a engorda de animais num período em que tradicionalmente a oferta é mais escassa. O resultado não poderia ser outro: o preço da arroba continuou em queda até atingir seu ponto mínimo num inédito mês de agosto, o que só aconteceu no ciclo pecuário de baixa de 2005 e 2006 e quando o preço passou a entressafra inteira em baixa, como em 2009.
Ocorre que atraso no início da entressafra deixou o período do meio do ano mais ofertado, mas as chuvas que alongaram a safra por mais dois meses apenas anteciparam a terminação de animais que ficariam prontos no segundo semestre, não alterando a oferta de animais no ano fechado.
Ao mesmo tempo, as exportações seguiram crescendo em agosto e a queda contínua da carne bovina nos supermercados desfez o seu prêmio sobre as outras proteínas. O preço da carne bovina caiu mais de 8% entre dezembro e seu ponto mínimo em julho, enquanto a carne de frango recuou apenas 2%. Como consequência, a situação deve se inverter: a demanda por carne bovina e, consequentemente, a demanda de animais para abate deve crescer, enquanto a oferta vai sofrer as tradicionais limitações da entressafra.
O regime de chuvas das últimas semanas migrou para o outro extremo. O excesso de chuvas em junho nas cidades representativas da pecuária se transformou em déficit em julho e agosto. A chuva abaixo do normal em agosto também se associou à temperaturas muito elevadas e a disponibilidade de pastagens se reduziu a um ritmo acelerado. Os estados que entraram antes na entressafra, como Mato Grosso, Rondônia, Tocantins e Goiás já mostram altas fortes no preço da arroba do boi, mesmo tendo registrado em abril forte intenção de confinar animais para este período da entressafra.
O mesmo começou a acontecer com os estados na vizinhança de São Paulo, onde o preço passou a subir ainda mais rapidamente nas semanas finais de agosto. O preço no atacado também subiu, um conjunto de altas que sinalizam um comportamento do preço da arroba na entressafra mais próximo da normalidade depois de um ano cheio de surpresas.
Os meses finais do ano devem se encaixar no figurino típico da pecuária. Os anos de alta mais forte no auge da entressafra geralmente apresentaram algumas das condições resumidas no quadro 1 adiante.
O crescimento forte das exportações nos últimos dois meses foi uma surpresa neste ambiente internacional conturbado, onde a atividade caiu primeiramente na Europa para, em seguida, desacelerar na Ásia. As exportações, porém, seguiram em alta em julho e agosto. O efeito da demanda dos importadores é sempre o mais importante nas estimações, mas a percepção crescente que a taxa de câmbio acima de R$ 2,00 é permanente também desempenha o seu papel.
Outra característica é o padrão de chuvas abaixo do normal durante a safra e, muitas vezes, também ao longo da entressafra (2002, 2003, 2007 e 2008). A safra deste ano mostrou chuvas irregulares e abaixo do normal, o que seria um fator de alta. Porém, a precipitação de junho, primeiro mês da entressafra, mostrou chuvas fortes e sabemos que a expectativa é o retorno de chuvas fortes a partir de outubro, havendo, inclusive, a perspectiva de excesso na passagem de dezembro para janeiro.
A segunda metade da entressafra com chuvas novamente acima do normal pode manter o mercado fora da normalidade, mas, o efeito de elevação da oferta de animais a pasto deve se concentrar mais adiante, já na safra 2013. Os meses secos entre julho e setembro se tornam um fator altista, mas a volta da chuva em outubro acima do histórico não deixa claro o seu efeito. Um detalhe importante é nunca ter ocorrido dois fenômenos El Nino iguais, o que aumenta a incerteza sobre a evolução do clima nos anos com este fenômeno.
Um terceiro fator de influência no mercado é o abate de fêmeas, cujo aumento em 2005 evitou que a combinação de exportações crescentes e chuvas abaixo do normal valorizassem a arroba na entressafra. A influência deste fator em 2012 pode se valer do seguinte raciocínio: como o abate de fêmeas foi elevado no começo do ano, não existe muito espaço para que cresça ainda mais.
Na mesma direção, a nossa estimativa da margem da cria não dá razões para um desinvestimento em matrizes que sustente o abate elevado de fêmeas por mais tempo.
O último fator é a oferta de animais confinados. Curiosamente, é um fator difícil de encontrar a relação direta entre o crescimento do confinamento e a variação do preço na entressafra. O ano em que essa influência foi mais clara é 2010, quando uma entressafra forte coincidiu com a queda nos animais confinados.
O Banco Original do Agronegócio realizou em abril uma pesquisa com mais de 200 confinadores. A pesquisa revelou à época uma intenção de aumento elevada, próxima a 19%, mas as condições de mercado mudaram muito desde julho e essas intenções não devem mais prevalecer.
Uma informação da pesquisa, porém, mantém a sua utilidade. Os confinadores pretendiam entregar 53% de seus animais ao mercado entre maio e setembro, enquanto 42% dos animais seriam entregues entre outubro e dezembro, período cuja mudança nas condições de mercado desde julho deve comprometer a oferta de animais confinados. Este universo representa algo como 1,5 milhão de animais cuja decisão de engorda no confinamento ficou comprometida pela mudança nas condições de mercado. O mês de outubro é o mais complexo para se avaliar, pois está na transição das decisões de confinamento antes do choque agrícola, além de concentrar a venda a termo para a indústria.
A conclusão é estarmos próximos de viver novamente os efeitos típicos da entressafra sobre a pecuária. O que saiu do padrão foi a queda do preço da arroba se estender até agosto, queda mais relacionada à extensão da safra por chuvas fora do normal numa situação de abates cadentes e menores que no ano passado nos meses até abril.
A extensão da safra já esgotou os seus efeitos sobre a oferta de animais terminados, enquanto os abates receberam o impulso de exportações em julho e agosto 27% maiores que no ano passado.
O consumo doméstico também perdeu o fator limitante do preço elevado da carne bovina em relação a outras proteínas. Este conjunto de fatores recoloca o mercado da pecuária numa situação mais próxima da normalidade.
O choque agrícola nos Estados Unidos elevou os custos da pecuária no mundo inteiro e reduziu a perspectiva da oferta de animais confinados a partir de outubro. O preço do milho (referência para o custo do confinamento) subiu menos no Brasil do que no mercado internacional. Exportações recordes de milho devem ir valorizando o preço doméstico até que este se aproxime mais do internacional. Consequentemente, a atividade de confinamento no Brasil vai continuar a enfrentar custos elevados e potencialmente crescentes nos próximos meses.
Em suma, a sequência de surpresas que deixaram o preço da arroba em baixa até agosto deve dar lugar a um pouco mais de normalidade no comportamento do mercado durante a entressafra. O regime de chuvas e os custos ainda estão sujeitos a incertezas, mas provavelmente o comportamento do preço da arroba nas próximas a semanas volte a ser típico do que acontece nas entressafras.



Fonte: Banco Original

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